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José Rodrigues (JR)

sábado, 19 de novembro de 2011

Meio Ambiente do Trabalho - O estresse está ao seu redor

Falta de perspectivas, prazos inalcançáveis, ritmo acelerado (ou lento) demais... Para o Dr. Hurrell, o ambiente de trabalho é a fonte da maior parte dos distúrbios relacionados ao estresse
Por Andreas Müller
No final de junho, o capítulo brasileiro da International Stress Management Association (ISMA-BR), a principal entidade de estudo e combate ao estresse no mundo, promoveu um amplo debate sobre as tendências em gestão de pessoas. Entre os debatedores do 11º Congresso de Stress da ISMA-BR estava o professor Joseph Hurrell, especialista em saúde organizacional pela Universidade de Saint Mary, no Canadá. Hurrell ganhou notoriedade a partir do final dos anos 1980, quando conduziu uma série de pesquisas sobre estresse e saúde pública para o governo americano. Para ele, o estresse é um “mal externo”, um problema que aflora por causa de fatores relacionados ao ambiente de trabalho – que nada têm a ver com a personalidade e com outras características específicas de cada pessoa. Nesta entrevista a AMANHÃ, concedida antes de sua participação no Congresso da ISMA-BR, Hurrell explica como essa abordagem pode ajudar as empresas a combater o estresse de forma mais eficiente – e barata.

 Que tipo de pessoa tende a ser mais suscetível ao estresse?
Eu realmente não acredito que exista algum perfil específico que esteja mais sujeito ao estresse. Nos últimos 30, 40 anos, uma ampla corrente de pesquisas tentou mapear as características individuais da personalidade capazes de levar ao estresse. Mas o que se descobriu de lá pra cá é que pessoas com os mais diferentes traços de personalidade podem desenvolver os mesmos distúrbios relacionados ao estresse. Ou seja: não é algo que dependa da pessoa, mas de algo externo a ela.

 Quer dizer que tanto as pessoas mais calmas quanto aquelas mais ansiosas podem sofrer os mesmos níveis de estresse?
Evidentemente, há alguns padrões de comportamento que podem favorecer o surgimento de distúrbios. Mas são apenas suposições. O que realmente há de concreto nos estudos diz respeito a um fator em comum: o ambiente de trabalho. Há uma série de características do local em que trabalhamos que pode, sim, desencadear o estresse. Aliás, é senso comum que o estresse surge em uma situação bem específica: quando as exigências do trabalho vão além daquilo que as pessoas são capazes de entregar. É esse processo externo – que independe das características inerentes a cada pessoa – que realmente provoca as reações físicas ou emocionais que caracterizam o estresse.

 E quais são as implicações disso para os gestores de Recursos Humanos, especialmente para aqueles que investem tempo e dinheiro em programas de controle do estresse – como ginástica laboral, ioga, psicologia etc?
A premissa básica é a seguinte: quem está disposto a controlar os níveis de estresse dos funcionários precisa atacar aqueles fatores relacionados ao ambiente de trabalho. Um desses fatores, ou pelo menos o mais óbvio deles, é a carga e o ritmo de trabalho. Os gestores têm de estabelecer um fluxo de tarefas e processos exequíveis, que respeitem os limites e capacidades do ser humano. É preciso olhar para o ambiente de trabalho e tentar encontrar os fatores que podem ser alterados nesse ambiente. Claro que, ao longo dos anos, já surgiram muitos programas que buscam reduzir os níveis de estresse com uma abordagem mais individualizada: exercícios físicos, alongamentos, ioga. Esses programas de abordagem individual são importantes e têm um papel a cumprir. Mas há algo mais importante a ser considerado, que é o todo. Claro que nem sempre será possível mexer no ambiente de trabalho. Mas, quando você mexe, os resultados são visivelmente mais efetivos. Você resolve o problema não só de uma pessoa, mas de várias – e
sem necessariamente ter de adotar abordagens individualizadas.
E quais são os fatores do ambiente de trabalho que podem desencadear o estresse?
O primeiro deles é a carga de trabalho, especialmente em um mercado extremamente voltado para a eficiência, que força as pessoas a fazerem cada vez mais coisas em um período de tempo cada vez mais curto. O segundo fator é o ritmo de trabalho – e aqui o problema acontece não só quando o ritmo é acelerado demais, mas também quando é muito devagar. Há estudos que mostram que algumas tarefas podem ser “lentas” ou fáceis demais para algumas pessoas. É o que acontece em ambientes com processos muito repetitivos, que exigem baixa capacidade intelectual para serem executadas – e que levam os funcionários a se sentirem pouco desafiados, com aquela sensação de que “empacaram” na carreira. Muitas vezes, os efeitos desse tipo de estresse podem ser tão ou mais danosos do que o de pessoas que trabalham aceleradas demais. Outra causa muito comum diz respeito à agenda de trabalho: às vezes, o trabalho se desenrola em carga e ritmo saudáveis, mas em horários que impedem as pessoas de atender a outras necessidades essenciais –
como conviver com os filhos, jantar com a esposa etc. Penso que é um dever das empresas criar cargos ou funções compatíveis com as demandas que as pessoas têm fora do expediente. Só isso já elimina vários problemas relacionados ao estresse no mundo corporativo.

 Mas isso não vai na contramão das atuais tendências do mercado de trabalho? Cada vez mais empresas funcionam com equipes maleáveis, em que cada pessoa desempenha funções e cumpre horários diferentes de acordo com o projeto que está em pauta... Essas empresas estão condenadas ao estresse?
Depende da forma como o trabalho está organizado. Se a empresa não souber gerenciar essa estrutura, então, sim, ela vai acabar se tornando estressante. E aí está uma questão crítica: as pessoas precisam entender o que estão fazendo. Precisam ter perspectivas. Muitas vezes, vemos funcionários ou líderes de áreas que não sabem o que estão fazendo e tampouco conseguem entender o que a empresa espera que eles entreguem. É o que chamamos de ambiguidade de papéis, algo que pode ser extremamente estressante para algumas pessoas. Essa ambiguidade pode levar a outros problemas correlacionados: conflitos de papéis, sobreposições de papéis e até um acúmulo exagerado de papéis – que é o que ocorre quando você acha que precisa fazer tudo sozinho. Você não pode ser tudo ao mesmo tempo.

 E como se ataca esse problema? Com a descrição de cargos?
O que as empresas precisam fazer é elaborar uma estrutura de trabalho em que cada pessoa tenha papéis claramente definidos. Isto é: onde cada pessoa saiba exatamente o que esperar da empresa – e o que a empresa espera dela. O curioso é que essa questão da clareza de papéis é um problema universal. Ocorre em todos os lugares, especialmente naquelas economias que passam por mudanças mais drásticas atualmente. Você sabe: a economia dos Estados Unidos e da Europa está passando por momentos difíceis. Isso cria um grande problema em termos de estresse. Não só por causa das incertezas ou do risco iminente de demissão. A situação é estressante também para aquelas pessoas que continuaram empregadas. Que enfrentaram os downsizings e agora estão tendo de se readaptar a uma nova realidade – em que há mais trabalho a fazer e mais funções a serem exercidas dentro de empresas com menos pessoas. É nesse contexto que os limites dos papéis exercidos por cada um se torna mais tênue.
Em contrapartida, o Brasil está em um momento de economia aquecida, com muitas empresas dando verdadeiros saltos de crescimento. O estresse é menor nesse cenário?
Na verdade, não. Vemos processos muito semelhantes acontecendo nas economias em expansão – entre elas, o Brasil. Quando as empresas crescem muito rápido, você tem mais acúmulo de trabalho e passa a lidar constantemente com a necessidade de assumir novas responsabilidades, o que leva ao mesmo problema da falta de clareza dos papéis. Aliás, do ponto de vista do gestor de Recursos Humanos, uma das formas de se conseguir um crescimento rápido e sustentado é justamente trabalhando para que os papéis e funções de cada empregado sejam sempre claros e bem definidos. É preciso criar um sistema que permita aos funcionários saber exatamente quais são as expectativas da organização mesmo em um cenário de crescimento e mudança. É incrível o quanto isso pode reduzir os níveis de estresse.

 Se temos estresse tanto nos momentos de crise quanto nos momentos de economia em expansão, de que forma podemos eliminar de fato o estresse?
Não é possível eliminar o estresse por completo. O melhor que podemos fazer é eliminar uma grande parte do estresse no local em que ele tende a aparecer – o trabalho. Há uma série de coisas que as empresas podem fazer nesse sentido, da mesma forma como há uma série de coisas que os próprios indivíduos podem fazer. O primeiro passo é trabalhar nos fatores que geram o estresse – especialmente os fatores associados ao ambiente de trabalho.

 Não há nada que as pessoas possam fazer individualmente?
Há, é claro que há. Mas as opções são conhecidas. Trata-se de manter a saúde em dia, praticar exercícios, alimentar-se bem... E, principalmente, ter uma vida social. Procurar amigos, colegas, ter pessoas com as quais dialogar – em outras palavras, buscar fontes de “suporte social” não só no ambiente de trabalho, mas também fora dele. É nesse plano mais individual que entram as técnicas de relaxamento: meditação, música, ioga etc. São apenas alguns exemplos do que as pessoas podem fazer no plano individual para lidar melhor com os fatores estressantes do trabalho. Essas técnicas, porém, não são necessariamente as mais eficientes para as empresas. Numa abordagem corporativa, eu acredito que as melhores abordagens são aquelas que buscam eliminar fatores estruturais do de estresse no ambiente de trabalho.
O estresse pode ocorrer não só quando o ritmo de trabalho é acelerado, mas também quando é devagar. Tarefas fáceis ou lentas demais são muito estressantes

 Quais são os sintomas de que o ambiente de trabalho se tornou estressante?
Há uma série de variáveis. Uma das mais importantes é o absenteísmo. Um aumento na ocorrência de ausências e pedidos de dispensa pode ser um sintoma de aumento dos níveis de estresse. Outro sinal amarelo é quando os funcionários começam a frequentar demais a enfermaria da empresa – ainda que os motivos sejam aparentemente banais. Às vezes, porém, a coisa é mais sutil. Uma redução na produtividade sem um motivo palpável, por exemplo, pode ser um sinal de estresse. O importante é olhar para as pessoas. São elas que manifestam os primeiros sintomas. Felizmente, o gestor não precisa ser um especialista em saúde para reconhecer esses problemas e tratá-los. Muitas vezes, é tudo uma questão de sentar e dialogar.
E como as empresas podem descobrir se estão tratando adequadamente esses sintomas?
As consequências são muito visíveis. Inclusive nos custos da empresa. E aqui não estou falando somente dos custos intangíveis, relacionados à saúde e ao desgaste dos funcionários. Estou falando também dos custos financeiros. O estresse causa absenteísmo. Causa perdas dramáticas de produtividade e, em casos extremos, impede que as pessoas continuem trabalhando. São problemas que exigem tratamento e que, muitas vezes, acabam afetando toda a família.

 Tirar férias ajuda?
Muita gente decide tirar férias para reduzir o estresse. O problema dessa abordagem é que o trabalho – e todos os fatores que causaram o estresse – continua lá quando as férias acabam.

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