A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) que converteu em rescisão indireta o pedido de demissão de um ex-trabalhador. O trabalhador pediu demissão por não ter conseguido superar o trauma psicológico causado por um acidente que vitimou seis colegas de trabalho no pátio da empresa em 2007.
AcidenteO trabalhador descreve na inicial que foi contratado como ajudante geral para carregar, descarregar e lixar botijões e cilindros de gás de 13, 20, 45 e 90 kg recebidos de outras empresas fornecedoras. A requalificação dos botijões de gás atende a uma determinação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), e tem como finalidade garantir aos consumidores de gás liquefeito de petróleo (GLP) a devida segurança na utilização de vasilhames (botijões) dentro de suas residências e/ou estabelecimentos. A certificação do serviço é feita pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – Inmetro.
O ajudante revela que, em junho de 2007, ocorreram três acidentes com fogo no pátio da empresa. O primeiro foco teria ocorrido sem deixar vítimas. No segundo, um dos empregados foi hospitalizado com queimaduras de primeiro grau no rosto e de segundo e terceiro graus nos braços. No terceiro, uma grande explosão acabou vitimando seis empregados, que morreram em decorrência de queimaduras que chegaram a 90 % do corpo.
Segundo o trabalhador, a explosão ocorreu quando a válvula de um dos botijões, que estava quase cheio, foi aberta em local inapropriado, próximo a maçaricos, lixadeiras e soldadores. Ele conseguiu se refugiar em um vestiário onde ficou por cerca de três minutos, até baixar o fogo, e, ao sair, viu colegas correndo com o corpo em chamas, e outros caídos. Logo depois, foi levado ao hospital com alguns colegas com ferimentos mais leves, pois tinha dificuldade em respirar. Após passar a perícia técnica da polícia, retornou ao trabalho e foi obrigado a limpar o pátio onde, segundo ele, havia "roupas queimadas com restos mortais de seus colegas".
Pedido de demissãoDepois do ocorrido, o auxiliar foi encaminhado a sessões com um psiquiatra pago pela empresa, que recomendou seu afastamento do trabalho. Depois de ter uma licença de 15 dias, o médico concedeu mais quinze dias. Este segundo período não foi aceito pela empresa. Segundo a inicial, um supervisor se referiu aos empregados em tratamento dizendo que eles estavam "de frescura". A empresa, ainda de acordo com a inicial, teria cancelado o tratamento, acusando o psiquiatra de tentativa de "golpe" e o empregado de "se aproveitar da situação", obtendo sucessivos atestados.
Diante disso, o empregado pediu demissão, por não mais conseguir trabalhar devido ao abalo psicológico sofrido. Na ação trabalhista, pediu indenização por dano moral, adicional de insalubridade (que alegou nunca ter sido pago) e a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta, com o consequente pagamento das verbas decorrentes do fim da relação de emprego.
Rescisão IndiretaA 3ª Vara do Trabalho de Canoas (RS) considerou que o abalo psicológico alegado não seria motivo suficiente para a conversão do pedido de demissão, por se tratar de pedido genérico. Concedeu R$ 6 mil por danos morais e condenou a empresa ao pagamento do adicional de insalubridade.
O trabalhador recorreu ao Regional, que converteu a demissão em despedida indireta. Segundo a decisão, a falta de medidas de segurança do trabalho atrai a aplicação do artigo 483, alínea "c", da CLT, o qual autoriza a rescisão do contrato de trabalho quando o trabalhador "correr perigo manifesto de mal considerável".
Nas razões do seu recurso ao TST, a empresa alegou que o trabalhador é que teria pedido demissão e, portanto, não deveria ter sido concedida a rescisão indireta. Para ela, na rescisão de contrato de trabalho se faz necessária a "presença do princípio da atualidade", ou imediatidade, entre a despedida e a justa causa, e, no caso, o trabalhador ajuizou a ação dois anos depois do ato que alegava como motivo para a rescisão indireta.
O relator do recurso, ministro José Roberto Freire Pimenta, ressaltou que a decisão Regional não tratou do princípio da imediatidade e não emitiu tese a respeito, conforme exigido pela Súmula 297, itens I e II, o que impediu a demonstração de divergência jurisprudencial. Seguindo o voto do relator, a Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso da empresa, mantendo a decisão regional.(Processo: RR-112400-79.2009.5.04.0203).
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